Muito tem se falado sobre intolerância. Quase sempre, fala-se apontando o outro, de forma acusatória. O intolerante é sempre o outro. Ou seja, eu chamo o outro de intolerante, mas reafirmo a intolerância em meus próprios atos.
Numa tentativa de definição do conceito, quem poderia ser caracterizado como intolerante? Eu definiria como aquela pessoa que agride verbalmente, que nega o saber alheio, que não coloca em dúvida suas próprias crenças.
Um exemplo político: se o sujeito apoia o ex-presidente Lula, nega qualquer possibilidade de existir bom senso, coerência nos apoiadores de Jair Bolsonaro, Ciro Gomes, João Doria. Eles são idiotas, fascistas etc etc. Nessa perspectiva, apenas está certa a pessoa que concorda com as mesmas ideias que o sujeito defende.
Acontece que, no momento em que vivemos, o inverso também ocorre. O outro lado frequentemente tem atitudes e crenças semelhantes. Age da mesma forma, rejeitando os argumentos de quem apoia o político rival.
Isso instaura um clima de rivalidade, de ódio. Há um desejo visível de silenciamento da diversidade, do opositor – exemplo claro disso é que nos irritamos com certas postagens na internet e até bloqueamos (ou rompemos a amizade) pessoas no Facebook etc. – a cultura do cancelamento é um sintoma claro da falta de tolerância. Falta a aceitação de que o outro pode pensar diferente de mim e faz isso, quase sempre, por acreditar que aquilo que pensa é o melhor para ele, para a família e para a sociedade onde vive.
Se a gente partisse sempre da compreensão de que o outro, por mais que pense algo absurdamente diferente de mim, deseja boas coisas, agiríamos de outra maneira. Talvez nos desarmássemos, discutiríamos ideias e não pessoas.
Outro exemplo, quem intenciona debater gênero nas escolas, faz isso por que acredita de fato que pode construir uma sociedade mais justa. E quem rejeita, rejeita também baseado em seus valores, entendendo que tal ensino é inadequado. Aí alguém pode comentar: “mas tem pessoas agindo com má fé!”. Respondo: quando não vai ter? Isso só não aconteceria num mundo utópico, perfeito. Mesmo as melhores causas poderão ser distorcidas por pessoas mal intencionadas. Entretanto, não significa que a maioria comporta-se/age de tal forma.
Termino aqui fazendo um apelo: é preciso dialogar mais! E se o diálogo não parece possível, que sejamos capazes de racionalizar as emoções e conter nossos instintos. Que possamos compreender que somos todos feitos da mesma matéria, somos todos humanos. Esse planetinha (chamado Terra) foi nos dado para dividir com pessoas que gostamos e achamos interessantes, mas também com aquelas que, por vezes, rotulamos como imbecis, idiotas, estúpidas etc. A história está repleta de exemplos do quanto é nocivo (e até mortal) esse sentimento de negação do outro que é e pensa diferente de nós. Que aprendamos com o passado e não voltemos a repetir os mesmos erros.
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Ronaldo Nezo
Jornalista e Professor
Especialista em Psicopedagogia
Mestre em Letras | Doutor em Educação
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