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Agenda de criança

Perguntei ao meu bisneto de 9 anos se ele teria um tempinho para ir comigo comer um hambúrguer numa lanchonete. Ele respondeu que seria legal e que acharia um tempinho sim, porém primeiro precisaria consultar a agenda.

     Só então me dei conta de que agenda de criança não é moleza hoje em dia. Quando eu era menino, muitas luas passadas, a gente ia também à escola e tinha um momento para fazer os deveres de casa, mas sobrava tempo para viver plenamente a infância. Futebol, banho de rio, matinê de cinema, leitura de gibi, brinquedos diversos e “artes” várias preenchiam os nossos dias sem nenhum medo ou estresse.

     A modernidade mudou tudo: obrigou a garotada a assumir precocemente compromissos e responsabilidades de gente grande. Meninos e meninas têm uma agenda pesadíssima: além das aulas regulares, frequentam cursos paralelos de inglês, música, judô, balé, robótica, sabe-se lá mais o quê. E ainda tem o celular, que prende todo mundo por horas e horas, roubando até boa parte das horas de dormir. Daí fica mesmo difícil achar uns minutinhos livres para ir à lanchonete com o biso. A sorte é que o biso nunca tem nada que fazer, e então pode esperar. 

     Sairiam todos ganhando, caso tivessem como conversar mais – pais e filhos, netos e avós, bisnetos e bisavós. Me arrependo até hoje por não ter batido longos papos com os meus pais e avós. O vô e a vó paternos não conheci, mas com o vô e a vó maternos convivi até os 12 anos, quando eles partiram para a eternidade.

     Poderia ter ouvido deles histórias interessantíssimas, inclusive sobre as raízes de nossa própria família. Eles nasceram no século 19, poderiam ter falado sobre a monarquia, sobre o início da república, sobre os primeiros anos do século 20, sobre as mudanças nos usos e costumes. Meu avô era um homem da roça, mas gostava de ler, sabia das coisas. Meu pai também, embora fosse igualmente da roça, era bem informado, lia jornais. Minha mãe tinha só o curso primário, porém tinha sempre um livro na cabeceira e até escrevia poemas.

     Pois é: e eu conversei tão pouco com eles. Falta de tempo não era; era só bobice minha, que na época não pensava no valor do diálogo entre as gerações.

     Você, que está lendo agora esta conversinha, se tem na sua família pessoas de idades diferentes, aproveite bem esse privilégio. Estimule, sempre e tanto quanto possível, o diálogo entre os mais novos e os mais vividos. É muito bonita a troca de experiências entre os meninos e os bisos. Sei que os jovens vivem correndo. Sei também que é meio complicado achar assuntos que interessem ao mesmo a todos. Todavia, com um pouco de jeitinho e habilidade, dá para criar encontros familiares extremamente prazerosos.           

      Comer um lanchinho é bom. Com os bisnetos ao lado é bem melhor. E muito melhor ainda é o papo que rola enquanto a gente se farta no hambúrguer com refrigerante e batata frita.

     O biso pede sempre bis quando isso acontece. 

A. A. de Assis
Foto – Reprodução

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