Sentado num balanço rústico, Almir Sater sente a luz solar aquecer seu corpo enquanto conversa por videochamada. O cenário ao redor remete ao de “Pantanal”, a novela em que ele contracenou há pouco com o filho, Gabriel. O verde, porém, não é pantaneiro.
O músico está em sua casa, na Serra da Cantareira, em São Paulo, e parece tão sereno quanto seu novo disco, “Do Amanhã Nada Sei”, que chega às plataformas digitais nesta sexta (28). É o seu primeiro álbum de inéditas desde “Ar” e “Ar+”, vencedores do Grammy Latino, em 2016 e 2018.
Num tom bucólico, a nova obra de Sater mantém a veia caipira de sua carreira e traz faixas que refletem a vida no campo. Mais lentas, as canções de seu sertanejo flertam com folk e, em alguns momentos, fazem um aceno a um samba otimista.
As letras vão de paixões platônicas a questionamentos sobre o território brasileiro. É como se o disco tivesse saído diretamente de “Pantanal”. Não é exagero dizer que poderia ser a trilha da novela.
Não à toa, ele afirma que “Do Amanhã Nada Sei” foi muito influenciado pela trama. Sua produção veio ao mesmo tempo que o ator gravou o remake da novela, que, segundo ele, teve impactos semelhantes aos da versão original, da qual também participou, em 1990.
“São épocas, pantanais e mundos diferentes, mas a emoção da fantasia se manteve a mesma”, afirma. Dessa vez, ele fez o papel do chalaneiro Eugênio. Seu antigo personagem -do violeiro que invoca o Diabo- ficou com o filho, Gabriel.
O artista diz que, ao voltar às terras pantaneiras, aproveitou para compor o novo disco e incluir as inspirações que viu despontar na pandemia -“quando ninguém sabia se o mundo ia acabar”. Vai ver, é daí a carga emotiva e reflexiva das letras.
O som brota de instrumentos como sua clássica viola de dez cordas, charango, mandolim, violão, cavaquinho e teclado. Tudo num ritmo de sossego rural.
“Existe um grande preconceito contra o caipira brasileiro, mas eu tenho orgulho de ser chamado de caipira. Muito mais do que de sertanejo”, afirma Sater. “Gosto dos cantadores de cururu, da Folia de Reis, do folclore, da nossa cultura.”
O cantor diz, porém, que tanto a música nacional quanto a gringa vêm deixando a desejar, e que os artistas atuais estão aquém daqueles de 40 anos atrás, quando iniciou sua carreira.
Pink Floyd, Bob Dylan, Eric Clapton, James Taylor, Tião Carreiro e Pardinho, Zé Coco do Riachão, Renato Andrade e Vieira e Vieirinha são alguns dos nomes que estão na playlist nostálgica do violeiro.
“Poeticamente, pioramos. E musicalmente, também”, diz ele. “Sinto falta de poesia. Vejo bons instrumentistas, mas poucas canções me emocionam.”
Segundo Sater, é natural que a música contemporânea esteja –nas palavras dele– pior, já que, antes, o “contexto do pós-Guerra havia injetado ânimo nas pessoas”.
O músico também critica o excesso de contato com as tecnologias digitais, marca da era contemporânea. Na faixa “Verdade Absoluta”, por exemplo, canta: “Me perdoem, novos tempos/ com seus reinos virtuais/ as pessoas se contentam com migalhas/ que sustentam tão estranhos rituais”.
Ele diz que criou uma conta no Instagram há pouco tempo e que, no geral, tem gostado da experiência. Ao mesmo tempo, afirma ver com preocupação a fissura pelas redes e a maneira como pessoas preferem passar mais tempo na internet do que no cinema ou na leitura de um livro.
Sater ressalta, porém, que suas visões negativas do presente são “só opiniões” pessoais, nada além disso. Depois, elogia o que chama de “maior liberdade artística”. Segundo ele, os artistas de hoje não são mais “reféns da indústria fonográfica”, o que ele vê com bons olhos.
Quanto ao cenário contemporâneo no Brasil, Sater afirma que é otimista com o futuro, mas não dá detalhes do que sua empolgação idealiza. Em vez disso, se restringe a dizer que os brasileiros precisam respeitar as opiniões uns dos outros, porque “democracia é isso”.
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