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Onidos da Osina

Num sábado de fevereiro, Mariquitinha acordou cedinho a patroa pedindo recesso de trabalho:
           
– Volto na quinta-feira de cinzas. Agora vou passar no Sovaco da Penha, grunir umas biribas e ajeitar a fachada aqui da menina pra sair no OO. Senhora vai me ver num luxo no OO.
              
– Mas que coisa é OO?
              
– Onidos da Osina… Rancho Carnavalesco Onidos da Osina, sabe não?… 
              
Mariquitinha tinha currículo ilustre na crônica do carnaval. Destaque nos melhores blocos: Deslumbrados da Aurora, Cocada de Coco, Rapadura Quente, Batuqueiros da Lua… Mas a glória dela era sair no OO, que aliás naquele ano prometia botar pra quebrar.
               
Mariquitinha era rainha máxima. Casar jamais pensara: tinha medo de arranjar marido chato. Marido ia incomodar. Ia ficar com ciúme do seu sucesso. Melhor continuar solteira, mesmo cinquentinha quase. Uma rainha não pode ser impedida de reinar.                            
–  Volto na quinta de cinzas, garantiu pra patroa.
              
– Tá bem, quarta é pouco, divirta-se. Nesses dias a gente manda trazer marmita.
              
Mariquitinha foi lá dentro, vestiu-se de festa. Se mandou. De noite o Onidos da Osina sairia com seu carro surpresa. A cidade reuniu-se na Rua do Café, esperando o desfile. Passaram as primeiras escolas, os ranchos… nada do OO.
              
A comissão julgadora nervosa no palanque. O prefeito, o delegado, a mulher do deputado, os importantes do lugar em exposição diante do povo que torcia, gritava, cantava, pulava. O Onidos aguardado como a grande atração da noite. Desfilaria num enorme carro alegórico em forma de navio, obra do velho Badeco Turco. Mas, cadê?…
            
O prefeito chamou um ajudante, mandou ver o que acontecera. Veio rápido o relatório:
           
– Sabe, doutor? Houve um pequeno engano. Fizeram o navio dentro do armazém do Seu Doca, só que não dá pra passar na porta. Eles se esqueceram de tirar a medida, agora estão lá discutindo se desmancham o navio ou derrubam a parede…
            
O prefeito aproveitou para iniciar sua nova campanha política. Pegou o microfone e anunciou: “Autorizo derrubarem o armazém inteiro se preciso for. Depois mando construir de novo, com dinheiro do meu bolso”.
           
Aplausos, foguetes, vivas. Marreta na parede. E o Onidos da Osina entrou triunfalmente na Rua do Café, Mariquitinha fulgurando na primeira fila, os tamborins repicando, a tuba pomponando, as frigideiras ritmando o samba, o povo em delírio, gritando.
            
Vitória retumbante do OO, medalha de honra para Mariquitinha. Na quinta-feira a patroa esperou o retorno da auxiliar famosa. Que entretanto só apareceu no sábado.
            
– Senhora desculpe, vou ter que deixar o emprego. Tinha um viúvo holandês vendo o OO na rua, gamou ni mim, vai me levar pras Europa. Quer casar…
           
– Ué, mas você não dizia que marido incomoda?
           
– Incomodar, incomoda. Porém tem hora que o bem-bão fala bem mais alto…

A. A. de Assis
Foto – Reprodução

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